Hoje mesmo postei um artigo escrito por mim defendendo que as lutas dos trabalhadores agora não são, ou não mais devem ser, somente por salários ou melhores condições de trabalho e que o momento nos exige lutas pela liberdade de expressão, pelo direito de lutarmos.
"Eis um desafio decisivo para a classe trabalhadora. Reconquistar o direito de greve não será obra de apenas uma categoria e exigirá a unidade do movimento sindical, que segue se pulverizando, consumido em disputas internas pela disputa dos aparatos. Pautar a reconquista do direito de greve, denunciar seu esvaziamento é uma tarefa que não pode ser postergada e deve ser priorizada pelos que apostam na construção de uma concepção classista no movimento sindical."
Se uma greve não pode interromper a produção
ou os serviços não tem eficácia
22/06/2011
Editorial ed. 434
Nas últimas semanas, importantes categorias enfrentaram suas campanhas salariais nas várias regiões do país. Entre elas, os metroviários, eletricitários, urbanitários, condutores de ônibus, ferroviários e trabalhadores em saneamento. Todos enquadrados no conceito de trabalhadores em atividades essenciais. A lei exige que publiquem editais com 72 horas de antecedência avisando a população da greve. Assim que os editais são publicados o Ministério Público do Trabalho ingressa com um pedido de liminar sobre a greve. Antes mesmo da greve se iniciar os Tribunais Regionais do Trabalho concedem liminares exigindo que até 90% dos trabalhadores permaneçam trabalhando, assegurando o atendimento dos serviços considerados “inadiáveis”. Estabelecem multas de até R$ 200 mil reais por dia, caso os sindicatos não cumpram a ordem judicial. O valor da multa e os percentuais variam em cada região, mas sempre determinam que se assegure 100% das atividades em funcionamento.
A greve é uma forma de tentar obrigar a empresa a fazer algo que não pretende fazer ou não está obrigada por lei: conceder aos trabalhadores vantagens não necessariamente previstas em lei.
Se uma greve não pode interromper a produção ou os serviços não tem eficácia. Não exerce pressão. Não é greve.
Trata-se de um direito conquistado com muitos sacrifícios pela classe trabalhadora. E ao longo de mais de meio século em que deixou de ser criminalizado e passou a ser admitido em nosso ordenamento constitucional, o Estado sempre buscou suprimi-lo indiretamente através da lei ordinária. Converteu-se numa arma fundamental para derrotar a ditadura a partir do final da década de 1970. Um direito que foi reconquistado enfrentando intervenções sindicais, demissões e até prisões. Foi a grande bandeira da classe trabalhadora nas eleições constituintes de 1986. E assegurou uma conquista decisiva na redação do artigo 9º da Constituição Federal de 1988, inspirada na lei surgida durante a Revolução dos Cravos em Portugal.
“Ter um direito” significa que o Estado deve garantir sua efetivação e que todos os cidadãos devem respeitar esse direito. Porém, ao longo da ofensiva neoliberal iniciada nos anos 1990, gradativamente o direito de greve foi sendo esvaziado, tanto por leis ordinárias como pelo entendimento dos tribunais. Atualmente, para as categorias que integram o que a lei denomina “serviços essenciais” podemos afirmar, sem exagero, que já não existe.
De fato, no campo das chamadas “atividades essenciais” para o setor privado foi baixada uma lista de atividades tidas como tal, e exigida a manutenção de um esquema de emergência durante a paralisação. Esquema este que os tribunais vêm transformando na exigência de 100% de funcionamento. Alimentados continuamente pela intensa campanha dos grandes veículos de comunicação que jogam a população contra os grevistas, impedindo que entenda suas reivindicações enquanto trabalhadores, as greves são estigmatizadas e os que lutam são acusados de privilegiados que querem “chantagear a população”.
Estamos assistindo a uma gradativa retomada da capacidade de luta do movimento sindical. Amplia-se a luta pela conquista de aumentos reais, bem como para recuperar a perda salarial acumulada nos últimos anos. E a cada dia esta retomada se defronta com um direito de greve completamente esvaziado.
Cresce o número de greves, especialmente nas atividades privadas consideradas como “não essenciais”, mas sempre de curta duração. Neste momento, as ameaças de greve e mesmo as paralisações de curta duração têm sido suficientes para firmar acordos onde são assegurados o reajuste salarial e o percentual de aumento real. Mas é um quadro conjuntural que inevitavelmente irá se alterar. Nenhuma categoria se arrisca a enfrentar as multas e restrições que vêm impedindo o exercício do direito de greve e, quase sempre, retornam ao trabalho ante a concessão de uma liminar ou a ameaça de terem seu movimento julgado como “abusivo”.
O curioso é que a bandeira da reconquista do direito de greve não vem sendo empunhada com a ênfase necessária pelos dirigentes sindicais. Muitos sequer se aperceberam destas mudanças, e conduzem as campanhas salariais como se a greve ainda pudesse ser exercida com amparo legal.
Alguns dirigentes sindicais acham que esclarecer para os trabalhadores essa nova situação restritiva pode assustá-los. E como os avestruzes, preferem esconder a realidade e fingir que nada mudou.
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